terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Conceitos: Poliamor, outras formas de não-monogamia e monogamia



Então, galera, o Poliamor tem recebido uma atenção especial da mídia esses tempos (teve uma tab no UOL, uma matéria na iG e uma no G1) e sinto que, por mais esclarecedoras que essas matérias sejam, elas erram em alguns pontos... e mta gente vai buscar mais informações sobre poliamor a partir delas - e vai ter dificuldade de encontrar :P Então achei importante eu criar um post com as conceituações de maneira mais clara e direta pra que as pessoas possam entender mais desse aspecto básico do básico - os conceitos!




Vale esclarecer que o que vou escrever aqui não saiu da minha cabeça... tenho 9 anos de não-monogamia, 5 de organização de eventos poliamoristas e fiz a minha monografia no tema (não que no meio acadêmico isso seja lá grande coisa, mas pra quem não é de lá, serve pro pessoal entender que isso aqui não é uma orelhada, mas que tem origem em uma pesquisa séria sobre o assunto)

Monogamia: Não, monogamia não é estar com uma pessoa só. Um casal não é necessariamente monogamia. Monogamia é o tipo de relacionamento em que só podem existir 2 pessoas oficiais, ou seja, é uma relação fechada a 2. Isso quer dizer que os parceiros NÃO PODEM estabelecer outras relações, mesmo que queiram. Se existe a possibilidade assumida de, em algum momento, a relação envolver (consensual e legitimamente) uma terceira pessoa, já não é monogamia, por mais que pareça muito.


A traição não constitui o abandono da monogamia, pois continua havendo uma pessoa oficial e as "extraconjugais". A ideia de traição, nesse sentido, é totalmente coerente com a monogamia, sempre existiu, e sempre foi a maioria dos casos - durante milênios os homens puderam estabelecer relacionamentos extraconjugais públicos sem qualquer constrangimento, contanto que não tentassem oficializá-los. As mulheres não podiam socialmente e eram até mortas por traição... hoje em dia já não é mais (tão) assim, então a traição se tornou uma prática extremamente difundida, a ponto de estudos indicarem que 60% dos homens e 45% das mulheres são ou já foram infiéis. Isso indica que a monogamia vai mal? Mais ou menos. Talvez seja mais uma evidência de que a monogamia enquanto instituição social inclui a instituição da traição.

Na minha humilde opinião, Monogamia e Poliginia/Poligamia, são duas faces da mesma moeda. Dado o quanto que os homens sempre tiveram a liberdade de ter outros relacionamentos afetivos e/ou sexuais fora do casamento, a monogamia histórica não difere muito da poligamia. Na verdade, na poligamia/poliginia, as mulheres têm até mais direitos, por que as segundas, terceiras, etc. devem ser assumidas pelo homem e ele deve se responsabilizar por elas e por seus filhos... uma esmola que pode ser muito bem-vinda.



Quanto ao Poliamor, ele é um “termo guarda-chuva”, que foi criado para substituir o termo “não-monogamia responsável”. Ou seja, tudo que, antes da década de 90 (década de origem do termo poliamor), era não-monogamia e tinha uma concepção de “respeito” ao outro, igualdade entre os parceiros, foi aglutinada no termo “poliamor”. Pq a mudança de nome? Não queriam associar o que viviam com uma mera negativa da monogamia. Só isso mesmo.

Bom, então, como vamos saber se uma relação é poli ou não?

Segundo os meus estudos, para ser poliamor, uma relação qualquer deve ser não-exclusiva a 2 (apesar de poder ser exclusiva em números maiores), ou seja, os parceiros têm a liberdade afetiva e sexual de se envolverem em mais de um relacionamento afetivo e/ou sexual ao mesmo tempo, e isso se faz com os parceiros tendo consciência dessa situação, ou seja, sendo algo consensual. Ao mesmo tempo, essa liberdade serve a todos os membros da relação e, portanto, poliamor é uma relação igualitária.


Isso não quer dizer que uma pessoa deixa de ser poli por que está sozinha ou numa relação a 2. Uma relação não deixa de ser poli por que os parceiros não estão mantendo outros relacionamentos naquele momento. A questão é que eles PODEM manter outras relações. Na monogamia, mesmo que eles queiram (e mesmo que se envolvam), eles NÃO PODEM se envolver em outros relacionamentos.


Quando falo igualitária, também não falamos de uma igualdade absoluta, mas sim numa igualdade de possibilidades. Não é necessário que se fiquem contando quantos parceiros cada um teve pra que a liberdade deles fique com a mesma quantidade de pessoas. É até uma possibilidade, mas eu nunca vi nenhum poli que ao menos cogitasse a possibilidade de um controle desses. De qualquer forma, também é possível que haja um acordo levemente desigual entre os parceiros – por exemplo: um deles não pode ficar com amigos de um dos parceiros, mas o outro pode; se ambos concordam com essas pequenas diferenças e se a relação continua, na prática, aberta ou fechada para todos os envolvidos, tudo bem: é poliamor; se não é que temos que ver o que é.


Claro que eu poderia falar muito mais aqui sobre como os relacionamentos polis são, mas acho que é melhor eu resumir poliamor em uma frase: Uma relação é poliamorista quando seus membros não estão exclusivos a 2 e ambos têm o mesmo direito de estabelecer ou não outras relações afetivo-sexuais e/ou sexuais com novos parceiros (estejam eles estabelecendo naquele momento ou não), tudo isso de forma consensual.

Mas e como dizer se alguém é poliamorista ou não? Se a pessoa aspira por manter uma relação poli, ela é poliamorista. Simples assim :). Ela não precisa ser isenta de ciúme, não precisa estar em mais de um relacionamento... não precisa nem estar num relacionamento poliamoroso! Assim como um monogâmico pode estar numa relação poli numa determinada fase da vida, um poli pode estar numa relação monogâmica. Para entender melhor essa situação, dá uma lida aqui no meu post anterior sobre o assunto.


Mas e outras formas de não monogamia?


Vou fazer um resuminho aqui pra que esse texto seja o mais didático possível. Claro que vou esquecer alguma coisa, mas se lembrarem, me avisem!
Swingue: É quando um casal, numa relação (predominantemente) fechada tem momentos de interação sexual com outras pessoas ou com outros casais de uma maneira consentida, geralmente em que haja a participação dos dois parceiros. Não pode haver afetividade/amor para com o terceiro – ele está lá só para o sexo.


Relacionamento Aberto: esse termo é um pouco complicado, por que ele já mudou de significado algumas vezes. Atualmente está se consolidando um conceito no qual um RA é uma relação a 2 em que há permissão no envolvimento sexual extraconjugal, mas não afetivo. No RA, geralmente, existe um casal afetivo-sexual prioritário e as outras pessoas com as quais se relacionam são de vínculos só sexuais e considerados “menos importantes” que o primeiro, ou seja, existe hierarquia entre os relacionamentos.



Amor Livre: amor livre pode significar uma imensidão de coisas. A história do termo envolve uma grande apropriação do termo. Ele pode significar desde relações independentes do Estado ou da Religião, mas ainda monogâmicas, até relacionamentos poliamorosos. Basicamente, se alguém te disser que ela defende o “amor livre”, peça para que ela explique o que quer dizer amor livre para ela.



Relações sem vínculo: é o tipo de relação que é exclusivamente sexual e não pode se estabelecer um vínculo afetivo – seja por que eles consensualmente determinaram que assim o é, seja por que algum deles quer que se mantenha assim.



Relações Livres: esse termo foi cunhado pela Rede Relações Livres, ou RLi, e é tanto uma relação, quanto uma identidade, quanto uma concepção de relacionamento. O conceito que vou passar para vocês foi aprovado por membros da Rede Relações Livres, então acho que tem uma certa legitimidade:

Relacionamentos Livres são relações afetivas e/ou sexuais em que os parceiros primam pela autonomia individual e possuem relacionamentos estritamente abertos, em que não há nenhuma regulação por qualquer das partes sobre com quem pode ou não ficar/se relacionar, tudo isso na base do consenso.

Segundo esse conceito, Relações Livres seriam um tipo especifico de Poliamor. Mais especificamente, a Ética em torno da qual gira a conformação das Relações Livres é uma forma poliamorosa possível (dentre várias) de lidar com os relacionamentos.

Isso vai causar uma confusãozinha, eu sei, por que uma porção razoável dos RLis (não todos) não gosta que a gente diga que eles são poliamoristas. Mas, conceitualmente, eles se encaixam em tudo... não têm exclusividade sexual nem afetiva, é igualitária entre todos os parceiros e é consensual. Uma relação RLi, portanto, é uma relação poli.
 

Claro que os RLis nunca aceitariam entrar numa relação de exclusividade a 3, coisa que alguns polis preferem. Mas não gostar de vários tipos de poliamor não nos faz menos poliamoristas, afinal, o termo é, como eu disse, um “termo guarda-chuva”, que existe para unificar várias formas de relacionamento diferentes, várias práticas diferentes. Eu, por exemplo, não toparia estar numa relação fechada, fosse ela poliamorosa ou não.

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Bom, acho que fiz bem o trabalho de apresentar as coisas pra quem não conhece nada! Claro que fui um bocado simplista e várias coisas ficaram de fora, mas falem sobre essas coisas! Comentem! :)

E aí? Se identificou? Expliquei melhor cada coisa? Se você se entendeu como Poliamorista ou quer saber mais sobre o assunto, eu recomendo que você entre e participe do grupo Pratique Poliamor Brasil, no facebook. Se você é do Rio de Janeiro, ainda pode entrar na Pratique Poliamor RJ, onde nos apoiamos no tripé "apoio, conhecimento e militância" e onde combatemos de maneira interseccional e não-sectária toda e qualquer forma de opressão e discriminação. Vários eventos vão rolar ano que vem, imagino que vocês vão se amarrar ^^



Valeu, Galera! Vontade e Sabedoria na Guerra!

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