segunda-feira, 16 de março de 2015

Depois de Enroladinhos e Coxinhas: Governo Dilma no momento

Semana passada, dias 13 e 15 de março de 2015, ocorreram os atos, respectivamente, pró-Dilma e pró-impeachment. É relativamente perceptível que o segundo teve mais gente e mais diversidade política (desde gente que nem o impeachment queria, até fascistas pró-ditadura), mas tirar daí só as conclusões políticas não é uma análise suficientemente profunda. Claro que para fazer uma análise de peso, seria necessário muito mais elaboração do que será possível expressar aqui num blog. Quero então, apenas fazer uma visão geral da atual conjuntura tendo em vista esses atos e a situação política geral do governo. Bora?




Primeiramente, é preciso entender qual a conjuntura econômica que está rolando no momento.

Bom, a economia não está quebrada - como gostam de afirmar os alarmistas de direita -, nem está passando por um problema temporário. O destino da crise ainda está em aberto e vai depender do destino da economia mundial. Vai passar? é claro, tudo no mundo passa - um dia até a Terra vai deixar de existir; mas se fôssemos nos pautar por isso...


A realidade é que a economia está dando sinais de paralisia e está começando a foder mais sério a vida da população.

A inflação de 6% é uma ilusão. Na vida do trabalhador ela é muito maior - por que a inflação geral conta com preços de todos os produtos... e trabalhadores não consomem tratores nem ferro bruto, por exemplo. O preço dos alimentos não pára de crescer; o preço dos imóveis (especialmente para compra, mas também para aluguel) testemunhou, nos últimos anos, um aumento de preços monstruoso; o preço da energia vai aumentar em mais 50% em alguns lugares; o preço da água também vai aumentar; o preço dos transportes vem aumentando acima da inflação há anos; o preço dos móveis aumentou menos, mas também aumentou; preciso falar do aumento do combústível? Até agora, as pessoas vêm lidando com isso usando o cartão de crédito... o que fez com que na classe média a quantidade de endividados chegasse a números gigantescos -  o que obviamente é uma grande merda para esses setores, já que a taxa de juros está escrotamente acima de 10% e os valores de rendimento das poupanças são ridículos.

A verdade é que as empresas que comercializam no Brasil vêm abusando do seu poder de lucrar, especialmente os bancos. O crescimento econômico ano passado já não foi tão grande quanto antes, mas é um crescimento em cima do que já tinha crescido antes... ou seja, grande pra caralho. Além disso, a balança comercial vinha tendo um valor positivo bem forte com as exportações de commodities. Pra melhorar ainda mais a situação dos empresários, o governo vinha enfiando dinheiro na economia (através de bolsa-família e minha casa minha vida) e liberando impostos (especialmente sobre a educação privada superior e os carros), ou seja, gastando mais e arrecadando menos... Isso sem contar com os vultuosos pagamentos de dívida pública, lá pra metade do orçamento... Isso tudo gerou um crescimento irreal e tinha que pagar seu preço alguma hora: a diminuição das exportações e uma trava no consumo. O que aconteceu? O óbvio: o crescimento caiu para caralho - e só tende a cair mais (Só pra dar uma idéia, a previsão nesse início de ano para o crescimento do PIB brasileiro é de vultuosos 0,3%, ou seja, muito perto de nada). Chega uma hora que os trabalhadores não têm como continuar pagando tanto por mais e mais mercadorias - nem aqui nem lá fora. Os empresários produzem mais e mais, a preços maiores e maiores... e as coisas encalham.


Outra verdade é que os empresários sabiam que isso ia acontecer alguma hora. Sempre acontece - é a crise cíclica de superprodução do capitalismo. Afinal, quem está demitindo mais agora? Empresas automobilísticas e de construção civil, que cresceram pra caralho nos últimos anos - e produziram pra caralho.

Isso quer dizer que a Dilma é inocente da situação atual? mais ou menos. Se, por um lado, não tem como fugir dessas crises numa sociedade capitalista, Dilma também optou por governar para os ricos e poderosos, dando um verniz de "esquerda" pra sua administração - que não muda em nada da tradicional do PSDB. Ou seja, se não fosse a Dilma presidente, teríamos crise do mesmo jeito; o fato de ser um governo burguês nos fez ficarmos desprotegidos e fodidos. Afinal, que tipo de medidas poderiam ser feitas hoje para evitar que os trabalhadores ganhem um banho de merda nessa situação? controle de preços, proteção do emprego, reforma agrária, reforma urbana, diminuição dos juros, parar de pagar a dívida externa... medidas bastante impopulares entre os grandes empresários - e que o governo Dilma não ia fazer.



Qual a receita típica da direita para essas situações? Cortar direitos trabalhistas, aumentar os juros, segurar preços controlados pelo governo... ou seja, potencializar os lucros e diminuir os encargos. Na situação atual de crise nas contas públicas, não teve jeito, teve que desfazer certas liberações de impostos. E, bem, é exatamente essa a política que o PT está aplicando. Seria diferente com Aécio no governo? Não.

Então pq diabos a direita tradicional está tão irritada? Pq agora, com a votação apertada no segundo turno das eleições passadas, eles podem cantar de galo. Temos um país polarizado e uma direita que cresce em cima da insatisfação da população.

Ou seja, a insatisfação que levou uma quantidade razoável de trabalhadores às ruas ao lado da classe média branca e dos fascistas é super justa (a insatisfação dos trabalhadores e até algumas da classe média, mas não dos fascistas!). Mas a alternativa de dar braços com os setores mais atrasados do país e as direções da direita tradicional, é uma alternativa muito mal escolhida.

Ao mesmo tempo, a defesa do governo Dilma é patética nessa situação, apesar do impeachment ser um terceiro turno das eleições - Quem votou na Dilma no semestre passado votou contra a política que ela agora aplica.

O PT também está um bocado fodido no nível institucional: com as trollagens do PMDB na Câmara e no Senado, o PT tem que dar mais espaço pra ele, mas tem que dar conta dos seus interesses internos e dos outros partidos aliados.

Então vamos lá... o que os atos da semana passada representam?

Bom, o ato pró-Dilma foi um fiasco. Muito menor que o ato pró-impeachment, a capacidade de mobilização da CUT, da UNE e do MST diminuíram muito... especialmente por que a Dilma traiu descaradamente os seus votos. A verdade é que os trabalhadores não querem sair em defesa de um governo que está lhe tirando direitos - o que é muito justo. E tanto é assim que o pessoal dessas direções teve que mentir na cara de pau dizendo que esse não era um ato pró-Dilma, mas que queria "pressionar o governo" pela reforma política. Tão achando que somos otários, né?

O Ato pró-impeachment foi um sucesso. Reuniu uma quantidade bem grande de pessoas em torno à crítica ao governo. Mas não podemos confundir isso com o crescimento da direita. É claro que os setores mais atrasados do país estavam lá e que o ato foi dirigido pela direita tradicional, especialmente o PSDB (o que levou a uma coleção de cartazes absolutamente ridículos e alucinados, que não deixam de me fazer rir no meu feed de notícias do facebook); mas não podemos esquecer do Bolsonaro sendo expulso do ato do Rio. Primeiro que a direita sempre é maior que a esquerda em tempos de capitalismo forte, ou seja, o ato do PSDB ser maior que o do governo (que, pra maioria da população, ainda é entendido como de esquerda, por mais míope que isso seja) não é nada de inesperado. O PSDB é hoje uma oposição forte, e isso é inegável, mas muita gente ficou em casa.

O PT não iria receber um apoio massivo daqueles que ela mais descaradamente enganou. E o ato da direita tradicional iria certamente ganhar setores amplos... afinal, qual é a alternativa que a população vê? Para a maioria das pessoas, ser contra o PT quer dizer apoiar o PSDB, apesar de uma enorme quantidade ainda não ser PSDBista nem PTista.

O que os atos mostram é que existe sim uma direita forte no Brasil, mas que existe algo mais: espaço. O que isso quer dizer? existe um descontentamento enorme com o governo, que, quem está capitalizando nesse momento é a direita tradicional... Ou seja, existe um conjunto de tarefas importantes no momento: desmascarar a corrupta direita tradicional (mostrando que ela é igual à direita governista), desligar os trabalhadores de classe média da pequena burguesia delirante de direita e apresentar uma alternativa pela esquerda a isso tudo, com uma política quer de fato mobilize os trabalhadores e os una contra o governo e contra a direita tradicional.

Ou seja, aquilo que vem rolando com dificuldades a trancos e barrancos na esquerda, tem que se consolidar e ser feito com sorriso no rosto: a unidade. É a hora de disputar as massas descontentes com o governo e mostrar que a direita tradicional não é a única alternativa. É preciso mobilizar os trabalhadores e fazê-los entrar em cena com uma pauta de esquerda, que defenda seus interesses. É preciso que PSTU, PSOL e PCB se unam entre si e às zilhões de organizações de esquerda que estão por aí para ser uma verdadeira alternativa.

É claro que isso não vai levar a um estouro de esquerda num primeiro momento. Mas, assim como a crise não está decidida no momento, os rumos da política também não estão. É preciso que os partidos se organizem e atuem conjuntamente para mostrar à população que a direita tradicional não é o único caminho e que é possível enfrentar a corrupção e as políticas de retirada de direitos e tarifaço. Para isso, é preciso que os partidos da esquerda façam uma pauta central conjunta e se jogue às massas, com um calendário de atos e lutas, politizando greves, criando espaços de organização conjunta... Tudo isso preparando o espaço para os momentos decisivos que virão.

E que pauta seria essa? Não pode ser uma pauta do "possível" diante de uma idéia de um talvez governo "de esquerda". Tem que ser uma pauta que não vá significar outra desmoralização dos trabalhadores. Temos que nos organizar primeiro contra o tarifaço, contra as medidas provisórias que tiram direitos dos trabalhadores, contra as demissões e contra a corrupção.

Esse último é importante, pq a direita tradicional está, contraditoriamente, sendo a única a ser entendida como oponente da corrupção do governo. É preciso que a esquerda seja ferrenhamente contra a corrupção e coloque em pauta que é a única que é a favor da prisão de corruptos e corruptores junto do confisco de seus bens.


Claro que essa pauta inicial não é suficiente para mudar a realidade do país, mas é essa que pode unir as forças de esquerda e mobilizar os trabalhadores. Mais tarde chegará o momento de propor políticas mais concretas. E é importante que, quando o momento chegar, estejamos juntos. É preciso superar as diferenças que existem no momento, as velhas rusgas e preconceitos e unir toda a esquerda. Só assim temos a chance de vencer.

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